Diário de um Diário

Querido diário

Hoje foi um dia bastante agitado. Após três semanas exposto na prateleira daquela papelaria, finalmente consegui ser vendido. Sinceramente, eu não agüentava mais aquela situação: ficar o dia inteiro ali, parado, com o Sol na cara, enquanto os clientes andavam pela loja, mal reparando em mim. Isso sem falar naquela vez que uma gorda entrou na loja com duas filhas, e acabou me derrubando no chão com a sacola. A filha mais velha viu tudo, e, ao invés de me colocar de volta na prateleira, me chutou – de propósito – para baixo da prateleira, onde fiquei até ser achado pela faxineira, dois dias depois. Gordinha vaca.

Mas, agora já estou em meu novo lar. Fica nos Jardins, em São Paulo e é um apartamento bastante luxuoso e bem decorado. Mas isso não faz muita diferença, já que minha nova dona – uma loirinha de uns 14 anos, com uma espinha monstruosa na testa – não parece muito disposta a me exibir por aí, especialmente na frente dos pais. Aliás, ela só escreveu em mim agora à noite. A tarde, quando chegou em casa, ela simplesmente me tirou da sacola e me colocou no fundo de uma gaveta, escondido.

Bom, sem muita opção, acabei ficando na gaveta até a hora dela dormir. Aí, sim, ela me tirou da gaveta, pegou uma caneta rosa, com um enfeite cafona (parece uma pena) e começou a escrever em mim. Eu, claro, fiquei todo pimpão. Mas já estou desanimado de novo.

Sabe, eu achei que, depois de uma eternidade na papelaria, finalmente eu teria serventia para alguém, que é o que sempre quis. Passava os dias sonhando em ser o diário de um aventureiro, que viajasse somente comigo e com uma caneta. Histórias épicas, de exploração, como aconteceu com meu tataravô, que foi diário de bordo de um navio mercante. Ou até mesmo o diário de um cientista que pesquisa a cura para alguma doença grave, e marcasse suas anotações em mim. Quem sabe? No futuro, eu poderia ser encontrado no fundo de um baú qualquer e ser leiloado, na Europa, por uma quantia fabulosa, com a imprensa se referindo a mim como um dos maiores patrimônios da humanidade.

Mas não. O único assunto que minha nova dona – ela se chama Isabela – parece saber falar é sobre um tal de Luiz Antônio, que mora aqui no prédio dela. Inclusive, ela já deixou claro que vai começar a namorar o Luiz Antonio em no máximo, seis meses, ou ela vai me rasgar e me jogar fora. Ou seja, se ela continuar encalhada, daqui a seis meses estarei num lixão da cidade. E, querido diário, com aquela espinha que ela tem na testa, minhas chances são bastante ruins.

Nada mal para um primeiro dia de trabalho, hein? Dá até vontade de voltar para a papelaria.

Agora vou dormir, porque preciso achar um canto para espremer nesta gaveta – e não está fácil, já que ela aparentemente guarda, aqui, tudo o que ela possui na vida, desde boletins do primário, até papéis de bombom (porque meninas têm mania de guardar isso?) velhos, que estão juntando formiga. Sem falar que eu acho que vi uma camisinha ali no canto. Rá! Tá fudido, Luz Antônio! Vai sobrar para você!

Bem, deixe-me ir. Aposto que ela vai querer me levar para a escola amanhã. Ou seja, seis horas da manhã, e eu enfiado no fundo de uma mala.

Vida besta.

18 comentários:

Thiago Dalleck 27 de novembro de 2008 às 17:39  

hahaha, muito bom =)

Metalinguagem... ou não XD

Barbarella 27 de novembro de 2008 às 17:40  

Fiquei com a consciência pesada agora, coitado do meu diário.
O fim dele foi triste, mas acho que ele se divertiu... com a minha vida besta.

**

Sir Lucas 27 de novembro de 2008 às 17:55  

O Rob é o Rob, né?

Muito bom.

:D

George Marques 27 de novembro de 2008 às 18:03  

Putz! Um metadiário! xD

O Rob é o Rob, né? [2]

Luis Filipe 27 de novembro de 2008 às 18:36  

muito bom
quem esperaria que um diario escrevesse um diario?

Gilmar Gomes 27 de novembro de 2008 às 18:50  

e eu, uma pedra....
ehuehuehuehuhee...
(piada pessoal que só eu entendo)

putz... Isabela... depois que batizei minha fiha com esse nome, parece que se tornou a nova "maria"...
tá que a minha Isabella tem dois "eles", mas não muda tanto...
e em todo caso, s eno futuro eu conhecer um rapaz chamado Luiz Antonio, ele que se prepare, vai levar... Porrada.

Anônimo 27 de novembro de 2008 às 19:09  

"e eu, uma pedra".

Charlie Brown mode:on.

(ou seja, nem tão interna assim, Gomex)

P! 27 de novembro de 2008 às 19:28  

Sinto que esse foi o que um dos meus diários pensou à uns tempos atrás.
Meu passado me condena.

Laila 27 de novembro de 2008 às 21:39  

Pooxa, eu escrevo no meu todo dia.
Mas não é bom espalhar não, com um monte de roubadores de diários por aí... não sei não.

Tyler Bazz 27 de novembro de 2008 às 22:46  

"e eu, uma pedra"
não é tão interna MESMO
aliás é uma das minhas cenas preferidas da história AUHauhaUHA

Quanto ao diario.. claaro que o Rob iria levar o conceito do "Ô Fase" para os diarios.. auhauhauhauha.. foi sensacional!

Anônimo 27 de novembro de 2008 às 23:48  

sensacional...

O Rob é o Rob, né? [3]

estava ancioso pro post do rob...nao decepcionou...
parabens a vcs pelo sucesso do blog

Varotto 28 de novembro de 2008 às 10:44  

"e eu, uma pedra....
ehuehuehuehuhee...
(piada pessoal que só eu entendo)"

É vocês não são os únicos. E como os abestados do Rob e do Tyler atrapalharam meu momento clímax genial de esclarecimento, vou especificar um pouco mais:

Charlie Brown especial de Halloween mode:on.

Anônimo 28 de novembro de 2008 às 11:15  

E eu... Outra pedra.

Anônimo 28 de novembro de 2008 às 11:54  

Aff... Claro que a frase em si, eu tinha certeza que todos vocês blogueiros, leitores e nerds (qui nem eu) entenderiam e saberiam do que se trata... Mas o sentido dela, nesse comentário é que é praticamente oculto... Mas o Rob sim, deve saber do que eu quis dizer... Diário de um diário, primiero sobre um objeto inanimado e tals... Pedra e tals... Hã, heins, hum?
Fim da piscada...
heuheuheuheuheuheuhuee

PS: mais um a ultrapassar os 2 digitos nos coments...

Stephanie 29 de novembro de 2008 às 14:46  

ôh, Rob, que irônia o diário do diário (que nem é tão querido assim, já começou ameaçado, tadinho) ser mais interessante que a finalidade que lhe foi dada pela tal mocinha da espinha

ótima sacada!

aliás, a idéia do blog é ótima, vocês estão de parabéns =)

Anônimo 30 de novembro de 2008 às 21:51  

Mt bom!

Me lembrou de um conto do Machado "Filosofia de um Par de Botas". É a trajetória do par de botas do ponto de vista delas mesmas. Recomendo!

SEmpre leio teu blog e gosto bastante. Parabéns!

Anônimo 21 de fevereiro de 2009 às 12:17  

fico pensando o q os meus diários pensavam de mim...

tiveram um fim triste, coitados..

Alisson&Mateus 13 de abril de 2011 às 08:22  

Achei interessante pelo fato de impressionar bastante.

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